Anúncios
Anúncios

O cheiro que não passa

Pela calada da noite, deixo o meu espírito deslizar para uma viagem que só existe enquanto se sente. Fecho ternamente os olhos e solto um aroma que se recusa a desaparecer; uma fragrância tímida que paira no ar como um segredo.
Será este cheiro proibido? Ou apenas um vestígio antigo que me chama pelo nome? Pergunto-me e não quero resposta: prefiro a dúvida que acaricia do que a certeza que prende.
Embrenho-me nesse doce aroma e, com receio e fascínio, deixo-me transportar. A brisa surge leve, enrola-se em mim como um abraço longo e conhecido; aquece o coração e, por outro lado, calma a alma cansada. Além disso, traz ecos de coisas pequenas; risos que ficaram, gestos que foram poeira e ficaram luz.
Abro os olhos nesse novo despertar e diante de mim está aquilo que só tu sabes dar: uma memória viva, um relicário de horas, um mapa das nossas falhas e dos instantes de beleza. Não é saudade que me tira o fôlego; é a presença desse passado que insiste em ser real.
Por mais que a vida tente mudar-nos, há pedaços que permanecem intactos e nos definem. Aceitar isso não é resignar-se; é reconhecer que o que nos encantou deve ser guardado com ternura, como se fosse uma chama que nos aquece quando a noite volta a cair.
Permito que o aroma me ensine: não há definições para tudo o que se sente. Aprende a acolher o que te chega, a devolver o que já não serve e a manter só o que te faz crescer. Sinto, claro, e partilho, porque um gesto sentido bem assim, simples e verdadeiro, é o que se espalha fácil, como fogo em palha seca.

Anúncios

Respostas de 2 a “O cheiro que não passa”

  1. Avatar de Odonir Oliveira
    Odonir Oliveira

    Que texto lindo.

    Liked by 1 person

Deixe uma resposta para Odonir Oliveira Cancelar resposta