Ah, quando isto acabar, talvez o tempo ganhe outro peso.
Não será apenas o regresso de festas adiadas ou de encontros suspensos, mas a revelação de quanto vale a presença humana quando a ausência se tornou rotina.
Será como atravessar uma ponte invisível: de um lado, a memória do silêncio, do vazio, das distâncias; do outro, a promessa do reencontro.
E nessa travessia, cada abraço será mais do que um gesto; será a restituição de um pedaço de mundo perdido.
Quando isto acabar, os dias comuns parecerão celebrações.
Um jantar simples terá o sabor de uma festa, um olhar partilhado será tão raro como um tesouro.
O arco-íris deixará de ser apenas fenómeno do céu; será metáfora de um espírito renovado, prova de que, mesmo depois da tempestade, ainda há luz a romper o cinzento.
E nenhum gesto ficará suspenso.
O beijo será dado com a consciência da sua urgência.
O amor será partilhado sem reservas, como se cada instante pudesse ser o último.
O abraço terá a densidade da saudade acumulada, e a carícia, a suavidade daquilo que se aprendeu a valorizar no silêncio.
Quando isto acabar, talvez os mares voltem a chamar com a voz antiga, mas agora ouvida de outro modo.
Mergulhar será mais do que um prazer: será um retorno à essência, ao contacto com o imenso.
Rios deixarão de ser apenas passagens de uma margem à outra; serão metáforas vivas da travessia interior que cada um realizou.
E haverá sorrisos acesos como pequenas fogueiras.
Cada flor oferecida carregará mais do que beleza: será lembrança de que a vida, mesmo frágil, insiste em desabrochar.
Mas a questão permanece: e depois?
Será que da experiência surgirá fraternidade verdadeira?
Será que a justiça encontrará finalmente o seu lugar?
Será que o mundo, após tanto se fragmentar, descobrirá a força da unidade?
Ah, quando isto acabar e vai acabar, ficará a prova de que a humanidade é capaz de resistir.
Mas mais do que resistir, talvez aprenda a transformar a dor em consciência, a ausência em valor, a espera em promessa.
E talvez, nesse instante, o maior triunfo não seja o fim em si, mas o início de um olhar diferente sobre tudo o que sempre esteve ao nosso alcance.

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Quando tudo passar
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