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Já não sei voar

Ontem, guardei as minhas asas. Simplesmente, deixei-as no fundo do armário, como quem esquece uma peça de roupa que já não serve. Não as toquei mais. Não sei se é por medo ou por cansaço, mas a verdade é que, a cada vez que tento levantar voo, acabo por cair. Tento uma, outra e mais outra vez, mas o desfecho é sempre o mesmo: a queda, implacável, como se a terra tivesse um íman que me impede de subir.
Já tentei pedir ajuda ao vento, suplicando que me erguesse, que me levasse de volta à leveza de outrora. Até desejei que o tempo me devolvesse aquele instante em que ainda sabia como era flutuar, livre, entre as nuvens. Houve dias em que, desesperado, me atirei dos montes mais altos, acreditando que o impulso seria suficiente. Mas mesmo nas colinas onde outrora me sentia invencível, as asas não responderam. O céu, tão distante, tornou-se inalcançável.
Sei que já fui mais altivo, mais ousado. Perder essa altivez dói. Talvez, no fim de tudo, o destino seja regressar ao casulo, voltar a ser lagarta, rastejar por um tempo, esperando pacientemente por uma nova metamorfose. Quem sabe, um dia, voltarei a voar.

  • Filipe Miguel

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